"O cheiro e o paladar são os sentidos que mais mexem com a mente humana.
O que me lembro de você é bem parecido com as palavras paciência, carinho e doce.
A vontade que vem, vez ou outra, é de sentir novamente esse cheiro, esse sabor, sentir também os pés, um pouco frios ainda, em cima dos meus ombros.(...) De ter uma oportunidade de parar o tempo em nossas vidas e apenas viver aquele momento.
Claro que nem tudo que desejamos podemos fazer ao mesmo instante e de uma só vez. Mas realmente desejei que estivéssemos ali todo o tempo. Que todos estes anos fossem preenchidos por uma parada temporal. E que nossos momentos infinitos fossem completos.
Desejei que o final daquele sonho não terminasse. A cada momento eu descobria mais que queria estar ali. E a dúvida da realidade nunca foi tão cruel comigo.
Mas qual será o motivo de estar escrevendo isso agora?
Meus quase lamentos são pelo que vivemos em um espaço tão curto, com tanta pressa. Como se no mundo existisse algo melhor para se fazer... E são sinceros como sempre. Eu não quero te deixar confusa com tanto blá blá blá, mas é que comigo esse sentido de te ver sentir prazer é uma satisfação pessoal, uma diversão.
Enfim posso dizer que gosto de você, e que, apesar do tempo, ainda te desejo muito."
Escrito por J.M. , dono das mais lindas homenagens que já recebi.
Decisão
Eu embolando meu pijama e colocando no cantinho do guarda roupas e você, teimoso, insistindo em dobrá-lo. É assim que nós somos: você organizando a confusão da minha casa e da minha vida, eu quebrando seu gelo, bagunçando sua agenda, roubando suas horas. Eu passo abrindo as portas, e você fechando-as.
Olhei para as malas, respirei fundo e repensei se daria mesmo certo. Duas criaturas completamente diferentes, em todos os sentidos, tentando se encaixar feito um quebra-cabeças estragado. Tive medo dessa decisão.
Mas deu.
E não estou falando só das nossas noites de pipoca e netflix. Tem dado certo todas as manhãs quando você se levanta para me dar um beijo de bom dia e todas as madrugadas em que velo teu sono. Tem dado certo quando fazemos piada com tudo e rimos até a barriga doer. Tem dado certo quando brigamos por causa da coberta cinza e terminamos embolados, grudados, ofegantes e satisfeitos. Tem dado certo até mesmo quando discutimos por causa da posição que o rodo fica no banheiro, e então eu me lembrei que são mesmo as peças diferentes que se completam.
E me encaixei em você.
Pregação
Na tarde de ontem, eu estava no meu local de trabalho, quando um senhor de meia idade que aguardava na recepção se aproxima do balcão. Do nada, pergunta se sou evangélica. Respondo com calma que não. Ele repete a pergunta, repito a resposta.
Me olhando com um misto de raiva e pena, ele pergunta: "Por quê?". Acho prudente ficar em silêncio. Me pergunta então se sou católica, e, na esperança de encerrar o assunto, digo que sim e me ponho a fazer algo para demonstrar que estou ocupada.
Ele insiste: "Nunca quis ser evangélica?" "Não", respondo já um pouco irritada pela inconveniência. "Por quê?", ele brada em voz alta. Com uma paciência forçada, digo lentamente que cada um tem as suas crenças e suas escolhas e volto a trabalhar. Insistente, ele me pergunta arrogante em que parte da bíblia está escrito que os católicos serão salvos. Mentalmente solto um palavrão e paro de prestar atenção no que ele diz. Uma cascata de fanatismo preconceituoso começa a jorrar da boca dele em forma de pregação, ignoro e exclamo "uhum" vez ou outra para fingir que estou prestando atenção. Ele não para. Distinguo que, nervoso, ele está citando versículos; faço cara de interessada na tentativa de acalmá-lo. Todos os pacientes o olham assustados e me encaram em seguida com olhares de acusação; Me questiono o porquê de tanto ódio, porque é que ele se incomoda tanto com uma afronta que não fiz? O senhor não é aparentemente portador de nenhum distúrbio mental, eu não o conheço e não dirigi a palavra a ele. O tratei com a educação típica que uso para lidar com o público. Me forço a prestar atenção, e ele está vociferando ofensas contra mim em meio à citações bíblicas.
Uma paciente, compadecida, inicia um assunto qualquer comigo, que volto minha atenção a ela e o senhor se cala. Depois que é atendido, antes de cruzar a porta, ele me lança um olhar de reprovação recheado de ódio, pragueja contra mim em voz baixa, e se vai. Volto a fazer meu trabalho, com paciência e educação.
Não é a primeira vez que passo por uma situação semelhante, elas acontecem com frequência em diferentes tipos de ambiente, e agora pergunto: Porquê as pessoas pregam tanto ódio e discriminação em nome de religiões que, na teoria, seriam feitas para disseminar o amor?
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