Num domingo comum, uma mensagem sua acende a nossa conexão, você escreve animado que está chegando em casa, que quer fazer fumaça, a gente ri e eu já sei ali que a nossa noite começou bem. Você chega com cerveja e pra minha surpresa até o alcóol parece gostoso. A gente canta, ri, se embriaga, e então naquels noite somos eternos.
Eu gostaria que houvesse uma maneira qualquer de guardar pra sempre, em potes transparentes, toda essa alegria que irradia nesses momentos em que parecemos ter sido feitos um pro outro. Um jeito simples de engarrafar aquele riso frouxo que você me arrancou enquanto rolávamos completamente bêbados pelo tapete da sala, ou o seu olhar enquanto dançava comigo no meio da fumaça, sem se preocupar com o volume do som. Se houvesse uma maneira de gravar a sensação daquele beijo apaixonado que você me deu, eu a repetiria pra sempre.
Quando estamos juntos nos divertindo eu me sinto plena e completa de um jeito perigoso. Eu sei que minha dependência atingiu níveis nunca atingidos antes. Mas eu não ligo. Quero o hoje, o agora, nosso sexo no carro no meio da estrada, seu gemido sincero, nossos risos, nossas conversas, nossas viagens, nossa casa e nossas coisas desorganizadas e tão cheia de nós. Quero você inteiro, completo, dormindo ou acordado, com a certeza sempre tão latente de que você é meu. Quero seu cheiro e seu gosto, o toque da sua pele, a pressão das suas mãos na minha cintura, o seu hálito no meu pescoço.
Talvez um dia eu me esqueça desses momentos, ou eles pareçam distantes o suficiente pra não me proporcionar esse frio gostoso na barriga como se eu fosse uma adolescente descobrindo a vida, mas eu quero escrevê-los enquanto ainda estão frescos na minha memória e enquanto ainda voam vivas as borboletas do meu estômago.


"Tô aqui na sua frente meio bagunçado,
Cheguei com o volume do som topado
Lembrei do rolê domingo passado,
Aí 'cê lembra bem. Nada é impossível,
Tudo é invisível pra quem só olha pra si.
Não é bem assim, é coisa de outro nível
Eu me acho incrível quando 'cê olha pra mim e gosto assim
'Tá pra nascer um maloqueiro disposto a soltar o dedo só por causa dela
Aí eu penso o tempo inteiro e até bate o desespero, o que sou eu sem ela
Eu danço com a nossa fumaça, me abraça no conversível, segura minha mão
Até o radar tirou uma foto e se nóis tivesse de moto, não pegava não
E hoje nóis bota pra fuder, ver o sol nascer, faço o que 'cê quiser
Nóis inventa outro rolê, um jeito de viver só com amor e fé.
E nada mais é como antes, nem fácil o bastante pra ver
Difícil entender que o sol de hoje não é o mesmo de ontem
Eu e meu mundo imaginário, 30 mil de salário
Era nós dois, deixando esses problemas pra depois
Era só bar, estúdio, os shows lotados
Mó clima de paz, revólver guardado
E se tudo der errado, eu vou sorrir e brincar com esse destino
As vezes todo mundo volta a ser menino
Aí revive e aprende tudo, nessa escola é só lição
Tudo é diversão
De brincar por nada
Sentar na calçada, conversar besteira
Mente bagunçada com várias parada e nóis de bobeira
'Tá pra nascer um maloqueiro disposto a soltar o dedo só por causa dela
Aí eu penso o tempo inteiro e até bate o desespero, o que sou eu sem ela
Eu danço com a nossa fumaça, me abraça no conversível, segura minha mão
Até o radar tirou uma foto e se nóis tivesse de moto, não pegava não
E hoje nóis bota pra fuder, ver o sol nascer, faço o que 'cê quiser
Nóis inventa outro rolê, um jeito de viver só com amor e fé
E hoje nóis bota pra fuder, ver o sol nascer, faço o que 'cê quiser
Nóis inventa outro rolê, um jeito de viver só com amor e fé
'To aqui na sua frente meio bagunçado
Cheguei com o volume do som topado
Lembrei do rolê domingo passado
Lembrou?"


Sei que entre nós houveram coisas em comum. Poucas, mas houveram. Por um longo tempo, alguma coisa em nós nos aproximava um do outro. Mas e agora, o que sobrou? O rastro dos seus olhos castanho-esverdeados percorrendo meu corpo? E todo o resto? Eu já não consigo me lembrar quais eram as coisas tão fortes que me ligavam a você, que me impediam de ir embora mesmo quando tudo já era pó.
É estranho e assustador te olhar e ser confundida pela memória de que tudo não passou de ilusão, carência, o conforto estranho de ter alguém. Será uma armadilha da minha mente apagando tudo que existiu ou realmente não existiu nada?
O amor se foi ou ele nunca esteve aqui?

Passei toda minha vida sonhando com coisas bregas e agora não fico mais pensando o quão boba você me acharia se soubesse cada uma delas. Evitava te dizer que você tem me permitido viver coisas as quais eu já havia descartado serem possíveis porque tinha medo de que isso fosse apenas mais uma ilusão. Mas você me fez voltar a acreditar no amor e em tudo de mais tosco e romântico que ele traz. Todas as experiências ruins e frustrantes que vivi me adormeceram para pequenos momentos de felicidade mas você me acordou e me fez poder sentir de novo.
Eu acordo de madrugada e vejo seu cabelo preto caindo nos olhos, tento te tocar devagar para não atrapalhar seu sono e esse cabelo brilhando naquele momento enquanto você dorme tranquilo é a coisa mais linda que eu já vi. Eu quero colocar todas as músicas que gosto, uma a uma, só pra poder ficar te olhando e desejando que esse momento seja eterno... Quero todo dia os seus olhos pretos me olhando desse jeito que só você sabe, com paixão e ternura, enquanto fico me perguntando com o olhar se tudo isso é mesmo real.
Não sei se você consegue entender o quanto a sua boca me envolve e que eu me sinto realmente levitar enquanto você me beija devagar, mas alguma coisa no seu suspiro levemente me diz que sua mente também flutua quando nossos corpos se tocam.
O tempo passa diferente do seu lado e seu abraço é tudo de mais confortante que eu tenho. Você não se importa quando coloco meus pés gelados na sua barriga quente, você não se afasta quando eu me enrosco em você de manhã. Você é tudo de melhor que eu poderia ter. 
Você é lindo, é lindo demais. Eu não canso de admirar e de pensar que sorte eu tenho, que sorte a gente tem de se achar no meio da multidão.
"Você é a coisa mais adorável que eu já vi"

Culpa

É estranho observar a maneira você parece precisar a todo custo se expurgar da culpa. Em mim ainda existe aquela velha sensação de que suas palavras são apenas um pretexto pra que você confirme se realmente foi marcante na vida de alguém, mesmo que de forma tão negativa. Não sei definir de que maneira o seu orgulho entra nessa história.
É extremamente confuso observar você dizer que sente muito. Eu senti muito, por muitos anos, enquanto você não sentia nada. Senti tanto a ponto de querer morrer ou matar. Senti amor, sim eu te amei. E senti ódio, como se nunca mais fosse ser feliz se não pudesse te fazer infeliz. Isso te diz alguma coisa? Isso te faz sentir muita culpa, muita tristeza ou muito orgulho? Bom, mas tudo bem, isso não importa mais. Não importa porque eu te perdoei. Sim, perdoei, precisei perdoar muitas pessoas para poder seguir em frente. Foi quando aprendi a lidar com todos os fantasmas que me assombraram por alguns anos que eles finalmente se foram permanentemente.
Então não espero que entenda o fato de eu não querer suas justificativas, pois precisei passar por todas as etapas para não continuar transformando tudo que passei em uma bola de neve, e esse caminho eu trilhei sozinha, não posso mudar o passado. Se você não vê intensidade do seu ponto de vista é pelo fato de que você não a viveu. Talvez você não entenda a gravidade mas eu precisei conviver concomitantemente com a depressão, o pânico, a ansiedade e com você. A história tem dois lados? Tem, mas também não muda o fato de que eu vivi coisas que jamais conseguiria descrever nem em mil textos. Quem sabe tudo tivesse sido diferente se eu não viesse de uma realidade doente, mas não foi. Essa é a minha realidade.
Se eu te acho um monstro? Não mais. Essa etapa também passou. Eu sei que em você, assim como em qualquer outra pessoa no mundo, há qualidades e defeitos, e sei que o tamanho do meu sofrimento foi circunstancial, não foi exclusivamente culpa sua. Mas isso não é suficiente para desfazer todo o mal que você me causou, consciente ou inconscientemente. Eu posso perdoar e compreender, mas jamais vou poder esquecer porque a minha realidade vem de dentro, vem do que passei, do que senti, principalmente.
Superar um trauma é possível. Sim, a gente supera, segue em frente, para de sentir aquela mágoa paralisante. Mas esquecer é uma outra história. É fácil pra qualquer um que não tenha vivido nada semelhante julgar a forma como lidamos com nossos medos e nossas lutas, mas eu acho que cada pessoa tem seus próprios métodos de aceitar as próprias vivências. Você pode encarar de uma maneira diferente meu sofrimento, e tá tudo bem.
No fim das contas eu acho que a pior parte de tudo que passei é ainda acordar as vezes com medo dentro de mim.
Mas a melhor parte é que todo o caminho que eu trilhei me trouxe até aqui. E eu estou bem onde estou, estou bem com a pessoa que me tornei. Eu consigo amar intensamente. Ver a morte de perto por tantas vezes me fez entender a vida de uma maneira que ninguém mais vai. E essa é a minha história, não a sua. Não posso reescrever o papel que você teve nela.
Essa culpa realmente existe? Se ela existe, ao invés de tentar se justificar, eu espero simplesmente que você possa se perdoar também. 

Já fazem mais de dois anos desde aquela noite em que te olhei pela primeira vez. Você estava com aquela camisa xadrez de mangas longas um pouco grossa praquela noite quente. Tinha nos olhos um brilho envergonhado e não sabia o que fazer com as mãos. Foi gentil comigo e eu fiquei te observando enquanto se abaixava pra ajudar com todo aquele trambolho adolescente com cheiro de fumaça adocicada. Depois se encostou no meu carro sem saber de quem ele era e ficou ligeiramente vermelho quando me viu me aproximando.
Naquela noite, conversamos muito sobre vários assuntos aleatórios. E quando você segurou levemente no meu queixo e me beijou, eu sabia que alguma coisa diferente se acendia em mim. Quando o dia amanheceu, fiquei vendo você sumir na curva e eu não sabia o que fazer com aquela sensação de que algo me ligava a você. E quando os dias foram se passando eu decidi que simplesmente você tinha que saber, tinha que saber que eu não queria ficar longe de você. E você também não quis ficar longe de mim, nunca mais desde então.
Eu não sei explicar como essa sensação, até hoje, nunca diminuiu. Às vezes eu te olho no meio da noite e sinto tudo se agitar dentro de mim. Às vezes me lembro da sua insegurança e da sua timidez do começo e sinto que te amo ainda mais. E quando você suspira, ainda dormindo, e me abraça, eu sei que meu instinto não errou. Alguma coisa mudou naquela primeira noite. De certa maneira eu já sabia que precisava ser sua.
Confesso que foi a sua maturidade que fez do nosso relacionamento um laço contínuo e saudável. Meus sentimentos a flor da pele e toda a minha imaturidade poderiam ter estragado tudo, mesmo explodindo tanto amor dentro de mim. Mas você me ensinou muito sobre viver a dois. Com você tudo é paz. Na contramão de todos meus outros relacionamentos recheados de tormento, você me deu "a sorte de um amor tranquilo".
Eu ainda sinto vontade de me beliscar quando passeamos, só nós dois, e nos divertimos como se não houvesse mais nada de importante no mundo além dos nossos momentos. E ainda custo a acreditar quando te vejo interagindo com meus amigos, alegre, e nossas noites de bebedeira terminam em sorrisos esganiçados e gemidos sufocados, apenas. Sem lágrimas, sem brigas, sem o vazio existencial que sempre me acompanhava antes de você chegar.
Eu nunca me canso de você. Eu durmo todos os dias do seu lado, e todos os dias de manhã você me beija pra se despedir antes de sair. Eu nunca me canso dos abraços, dos beijos, dos carinhos, do sexo, dos sorrisos, das conversas. Não me canso de te admirar enquanto dorme tranquilo, e das vezes que passo a mão pela sua barba e você geme sonolento. É abismal a maneira como durmo melhor do seu lado, sentindo seu calor. E a maneira como acordo tranquila sentindo você.
Eu te amo tanto, moreno. Tanto, que as vezes dá medo. 

Nós somos felizes, apesar de todos os percalços que um relacionamento tem. Quer dizer, eu sou feliz com você. Não estou aqui para definir o seu sentimento, mas o meu. E nesses momentos em que tudo está indo extremamente bem eu me sinto amedrontada, a felicidade me sufoca, não sei lidar com ela. Depois de todas as decepções que eu vivi, eu não consigo respirar toda essa paz sem pensar no fim.
Enquanto te olho dormindo, me pego calculando quantas sessões de terapia seriam necessárias para superar as lembranças desses momentos bons. Enquanto dançamos e rodopiamos pelo piso da sala eu sinto uma necessidade estranha de registrar com mais atenção possível cada detalhe, por medo de que eles se findem e nunca mais se repitam. Deitada no seu colo, recebendo um cafuné, você me olha com olhar de amor e eu me pergunto até onde tudo isso é real. Suspiro, numa mistura de medo e satisfação.
Me apavora a possibilidade da auto sabotagem que isso tudo pode causar. 
Ainda é difícil pra mim aceitar essa paz, esse conforto, essa segurança que nosso relacionamento me dá sem duvidar de que tudo é uma armadilha cruel pra fazer o resto da minha vida desmoronar.
É estranho estar de volta aqui. Como se eu estivesse tentando resgatar uma parte de mim que foi ficando pelo caminho, pelas curvas, pelas pedras, se perdendo no meio das minhas vivências confusas. E eu não sei se ainda consigo me expressar com as palavras como já consegui um dia. Não sei se posso botar pra fora toda essa dor que foi se assentando e se tornando turva aqui dentro... Mas eu preciso tentar.
Isso aqui é tudo que sei, tudo que sou, tudo que tenho. É onde pousaram as lágrimas e os sorrisos mais marcantes. Escrever é a minha salvação diante de todos os furacões que moram dentro do meu peito. É uma história especial que só interessa a mim, como se eu fosse única no mundo. Aqui eu me sinto mais sozinha e menos solitária, contraditoriamente.
Eu quero ter de volta a minha essência, o eu que as dores tentaram me tomar.