Eu me peguei aqui lembrando dos seus olhos... Você tem olhinhos pequenos da cor da noite que eu não consigo mais esquecer. Fico tentando saber em que momento ele passaram a me deixar essa saudade teimosa no peito e não consigo entender.
Sabe, moreno, eu sei que minha mente é confusão e tenho te assustado com tanta informação... Mas eu não consigo demonstrar devagar um sentimento que tem ficado meio descontrolado dentro de mim. São 5 da manhã e o sono não vem, eu penso nos meus erros e em todas as palavras mal ditas e quando vejo o medo já me tomou por inteira. Eu tenho medo de que você acorde em uma manhã qualquer e decida que não quer mais o meu abraço nem escutar as minhas palavras sem sentido. Mas aí penso nos seus beijos e nos seus cabelos e na sua sobrancelha arqueada de um lado só e quando percebo já estou sorrindo.
Você mexeu com a minha cabeça, moreno, acendeu alguma coisa dentro de mim.
Eu tenho um histórico de relações casuais problemáticas e deprimentes. Na maioria das vezes que conheço alguém, mesmo que o toque seja consensual, me sinto péssima, usada, violada e enojada...
Mas dessa vez foi diferente. Você acertou as palavras, olhou nos meus olhos, não me tratou como um pedaço de carne. Encostou em mim com cuidado, gemeu quando me viu gemer e eu não tive nojo de olhar pro seu rosto, pro fundo dos seus olhos pretos, pra cada detalhe do seu corpo... Me senti leve e em paz. Permaneci com a sensação do toque da sua pele na minha, da textura das mãos e das costas, da sua voz e do seu sotaque envolvente...
E agora queria conseguir fazer outra coisa que não fosse olhar pra essa maldita conversa repetidas vezes durante o dia. Queria ir devagar e seguir todas as regras de fingir desinteresse, mas essa não sou eu. Eu não sei fingir. Eu sou intensa, sou fogo, sou palavras e mais palavras jorrando em cima de você. Sou exagero, saudade, desespero. 
Talvez o meu jeito te faça ir embora pra sempre. Talvez eu te assuste mesmo como dizem. Mas eu não sei ser diferente. Eu sinto como se fosse a minha única chance de te dizer tudo o que me fez sentir em tão pouco tempo.


Meus dedos estão sujos de sangue e ele vem de gestos completamente conscientes: sei o que estou fazendo, só não consigo parar. Percorro a unha pelo couro cabeludo ferindo, rasgando, mas a dor parece um estranho conforto, uma distração; Eu separo com cuidado, mas nenhuma lógica, as cascas recém tiradas das feridas e "brinco" com elas até não sobrar mais nada. Não é divertido, talvez seja quase relaxante, se é que essa palavra poderia ser usada para o momento. Não estou pensando em nada específico, penso sobre o próprio ato, sobre o passado, sobre o presente, sobre eventos aleatórios. No momento exato em que alguma ferida se abre, sinto um misto de alívio e culpa. Dói, mas o sangue me fascina e me assusta ao mesmo tempo.
Eu quero parar, sei que quero, mas não dá porque alguma força estranhamente atraente me mantém tateando até não encontrar mais nada onde machucar.
Pensei que deveria dormir mas agora me dei conta que já se passaram 35 minutos desde então.
Nao há mais onde sangrar, eu paro.
Lavo as mãos e a dor se torna mais intensa junto com a culpa.
Procuro o que comer e tomo todos os remédios que preciso diariamente.
A cabeça lateja, mas não há nada de novo. Só espero dormir logo. 


Estava tudo meio misturado. Eu estava sonhando mas ao mesmo tempo semi acordada escutando você se movimentar de um lado a outro. A cama tinha seu cheiro, por toda ela; os lençóis, o travesseiro, as cobertas... Tudo parecia mais quente e reconfortante. No sonho, você estava chegando comigo, de mãos dadas, em uma faculdade ou algo assim, e de repente eu despertei com suas mãos no meu rosto, e eu garanto que disso nunca vou esquecer: Acordei olhando pros seus olhos castanho-esverdeados, tão vivos, e você disse: 'você vai fazer falta'... Eu não respondi. Mas por dentro tudo que consegui pensar é em como você vai me fazer falta também. Em como tudo isso vai virar uma saudade gigante dentro de mim. Tudo que consegui desejar foi poder ficar ali pra sempre, na sua cama, na sua casa, esperando você voltar e me abraçar apertado... Eu tenho tanto medo de ir pra tão longe de você. E eu queria dizer que vai me fazer falta cada pedacinho do que você é... O seu cheiro, as suas mãos, os seus olhos... A sua voz e o seu jeito único e fluido de conversar sobre todos os assuntos... As suas brincadeiras, os seus beijos, o seu sexo, até as suas mordidas... Eu vou morrer de saudade da textura da sua barba, da sua pele, do seu perfume, do toque da sua mão, da sua voz me dizendo que vai dar tudo certo, do seu sorriso contido vendo minhas palhaçadas, do seu jeito exato de me abraçar enquanto estamos deitados, e até do jeito que você acorda e geme preguiçoso antes de pular da cama... Eu vou sentir tanto a sua falta, anjo. Talvez eu nem devesse te dizer o quanto, mas não consigo mais esconder que de tudo que vai ficar pra trás, você é a saudade mais bonita que eu vou ter.


É isso. De repente, piscou nos meus olhos a proposta de deixar pra trás todas as pequenas coisas que conquistei em busca de conquistas maiores. E sei que não é como antes, não é como se eu pudesse me refugiar em casa duas vezes por semana. É uma longa estrada e uma vida inteiramente nova.
Eu já não esperava mais nada. Já não sonhava com nada muito além do padrão que sigo vivendo. Não que eu esteja reclamando, claro que não, só não sabia mais o que era esse frio na barriga, esse misto de medo e esperança que me tira o sono e me desencaixa de todos os eixos. E  por isso topei.
Nunca fui boa com mudanças, lidar com o desconhecido me assusta. Mas ao mesmo tempo visualizar qualquer história que seja diferente me salva da morte lenta e morna que é a acomodação. Em menos de um mês todo meu mundo vai mudar -pra melhor ou pra pior- e tudo que eu posso fazer é juntar todas as minhas forças pra encarar o que quer que esteja me esperando nessa cidade nova, nessas amizades novas, nessa vida nova.

Talvez você estivesse nervoso demais ou eu estivesse presa demais a histórias do passado. Não sei. Eu gostei da sua presença e gostei da sua conversa, mas não o suficiente, pois voltei pra casa e deixei a lembrança do seu beijo sumir. Mas você me disse que tudo tinha sido ótimo e que a minha boca era macia e disso eu não me esqueci. Por isso comecei a pensar em como eu estava passando todo o tempo me bloqueando e me blindando à qualquer sentimento de apego, fugindo das pessoas e das sensações, e comecei a entender que talvez eu só não tinha me permitido realmente olhar pra alguém.
Então eu quis te olhar. De verdade, sem medo, sem travas, sem projetar em você qualquer mágoa do passado.
E olha como o mundo é, nenem, eu te olhei e eu já sabia que era a escolha certa. Naquela tarde quente eu cheguei mais perto pra sentir seu perfume. É, foi por isso que eu me sentei do seu lado. Desde então seu cheiro é tudo que eu quero sentir.
Eu fiquei assustada por acabar chegando sempre nos mesmos lugares que os seus. Será que eu estava consciente de que só estava tentando me aproximar? Será que você estava consciente disso?
Você sabe, eu não sei lidar com essa história de gostar de alguém. Todas as vezes que eu tentei, você sabe nenem, deu tudo errado. Então não tem sido fácil e não é uma escolha minha duvidar de tudo a minha volta. Faz tão pouco tempo que você passou a ser importante na minha vida, e eu já não sei mais como seria se não houvesse você nela. Você entende que eu estou me apaixonando? Você sabe o quanto isso é perigoso pra mim?
Eu gosto do seu cheiro e gosto do seu cabelo preto. Gosto do seu beijo e da maneira como você me toca. Eu poderia passar várias noites seguidas te observando dormir ou conversando sobre a vida. Poderia ver todos os filmes do catálogo e ainda assim não teria me cansado de você.
Você é especial, nenem, e assaltar a geladeira de madrugada do seu lado é melhor d
o que qualquer balada cheia de gente vazia.

Liberdade

Eu me lembro claramente da sensação: a solidão tem uma força quase física. Eu ficava em casa quando queria sair pra me divertir porque não havia companhia. Eu tinha a casa vazia e não sabia quem convidar pra uma festa. Doía. Eu me relacionava com pessoas que não me queriam bem apenas para fugir do desespero que me assolava.
Passei carnavais trancada em casa com o vazio e as mágoas.
Eu o invejava porque ele tinha tudo que eu queria ter: tinha amigos, tinha diversão, tinha uma vida agitada e muitas opções. Eu acreditava precisar dele porque ele parecia me oferecer uma vida incrível, mas não oferecia. O que eu tinha era muito pouco e ninguém pode nos completar com tanto. Eu estava sozinha e a companhia dele não podia preencher todos os espaços. Mas eu quis desesperadamente que pudesse, eu me apeguei e me acorrentei àquele sentimento, mas eu era âncora e ele não fez com que eu parasse de afundar, pelo contrário, ele pisoteou com força e eu caí na velocidade da luz.
Mas de repente, sem que eu me desse conta, tudo mudou com uma intensidade incrível; e me deixando levar pela maré sequer parei para analisar. Eu me embrenhei na noite e me joguei nas festas como se o mundo fosse acabar, eu sanei todas as ausências e toda minha necessidade natural de agitação, eu fiz amigos e história.
Até que chegou o carnaval. Parece superficial, mas te garanto, não é. Foi nesse carnaval que eu respirei fundo e entendi que minha vida finalmente está em paz. Sei disso porque dessa vez eu tive escolha, eu fiquei por um único motivo: porque eu quis. Agora eu sei que tudo que sempre me faltou foi liberdade.
E hoje eu sei que não preciso de ninguém para me completar. Eu estou onde quero estar, eu faço o que eu quero fazer, não sou mais aprisionada pela minha doença.



Ele é lindo, sim ele é. Me olhava de um jeito apaixonante e me apertava nos braços quando me via - em qualquer lugar a qualquer hora -. Ele ria e cantava comigo como se fôssemos duas crianças, me mandava bom dia de manhãzinha e me enchia de beijos a noite.
E ele quase me enganou. Com aquela voz doce e aquele sorriso irresistível, eu quase me perdi de paixão.
Mas esse não é quem ele é. Eram truques e eu estive perto de cair neles. Por sorte eu aprendi a identificar detalhes, e foram eles quem mataram todo o encanto que ele havia me causado. Na mesma proporção que chegou o encanto o asco tomou o seu lugar.
Ele é só mais um cafajeste entre tantos.


Eu tenho uma relação doentia com o passado. Eu transformo em tormento até mesmo a melhor das lembranças, eu não sei sentir saudade sem melancolia. Todas as minhas memórias são carregadas de arrependimentos, saudosismo ou mágoas.


Um pedaço seu

Não importa onde eu vá, alguém sempre tem um pedacinho seu.
A expressão de olhar, a barba, a boca, o jeito manso de falar. Alguém tem suas manias, seus defeitos, seu jeito arrebatador. Sempre tem um pouco de você em cada esquina que eu piso, em cada corpo que encontro, em cada história que vivo.
Não sei até quando estou fadada a viver essa maldição, até quando os traumas vão me acompanhar, mas sua presença não para de me perseguir. Eu fujo das pessoas porque elas me lembram você, mas as semelhanças não param de aparecer... Talvez esteja só dentro de mim, talvez ele não tenha o timbre da sua voz, talvez aquele outro não tivesse a boca assim tão parecida com a sua, talvez as barbas sejam mesmo todas iguais... Não sei.
Mas não quero mais lidar com a sua presença imaginária, com os mesmos medos e os pré-julgamentos que são arrastados pela lembrança do passado. Estou cansada de estar aprisionada a reviver as dores que sua existência me deixou. 



"Memórias não são só memórias, são fantasmas que me sopram aos ouvidos coisas que eu nem quero saber..."

Final


Fiquei três dias sem medicação pra que eu pudesse chorar. Parece meio ridículo querer chorar, mas engolir toda a dor calada é muito mais cruel. 
Estou cansada de sobreviver. Os remédios evitam que eu entre em crise, seguram meu choro, minha palpitação, meus gritos, mas os remédios não me preenchem. Eu tentei tanto acreditar que tinha solução, acreditar que tudo não tinha passado de uma fase ruim, mas não dá pra ignorar o que já nasceu predestinado dentro de mim.
Estou cansada dessa sensação de dormência que todo esse controle médico trás. Eu quero liberdade, mesmo que ela me custe minha vida. Não quero provar que sou forte e cogitar sempre continuar por motivos alheios. Eu não quero continuar porque isso nunca vai parar. Já estou velha demais pra acreditar que, de alguma maneira mágica, tudo dá certo no final. O final já chegou.
Há três dias não tomo minha medicação e você pode acreditar que é estupidez, mas ninguém jamais vai entender como é precisar sair do piloto automático e respirar pra tentar entender realmente a situação.
Não é como se tivesse um motivo: não há um coração partido, um problema financeiro ou uma briga entre amigos que justifique o que sinto. Não há nada latente ou que possa ter despertado tudo isso. Simplesmente está aqui. Um vazio imenso e uma angústia paralisante. Uma insatisfação pessoal que não tem cura. A ausência de sonhos, de desejos, de boas memórias.
Eu não quero conhecer a praia, e também não quero me casar, nem ter filhos. Eu não quero aprender um outro idioma ou ir pra outro país. Não quero ser famosa e nem quero mudar o mundo. Nada existe pra mim.
Eu passei 20 horas dormindo e 3 horas ininterruptas chorando. Eu só quero que tudo acabe pra sempre. Não quero mais tentar.