O fim


Cafés esfriam. Sentimentos também; Pouco a pouco nossas longas conversas deram lugar a pequenas lacunas aqui e ali. Silêncio. Na volta do dia, os emotions começaram a aparecer onde não cabiam mais palavras, e a tela do celular passou a se acender cada vez menos. Vazio. Cada vez com mais frequência não sei o que falar quando estamos a sós. Cada vez com mais frequência você se mantêm calado nos nossos encontros.
Não sei em que momento eu passei a buscar, ávida, por beijos apaixonados e encontrar, decepcionada, lábios unidos em um beijo fraternal, mas quando eu me dei conta já havia um abismo entre nós.
Com lágrimas nos olhos, tento te explicar o quanto tudo está fora do lugar e que não há futuro pra gente. Você me acusa de ser pessimista, e insiste em dizer que estava tudo perfeitamente bem até eu vomitar paranoias na nossa história. Quando tento 
ser racional, vocifera que deixei de amar você, que nunca estive satisfeita e que não sabe porque eu ainda não fui embora. Talvez seja difícil pra você assumir que nos perdemos. Talvez eu nunca tenha realmente segurado sua mão.
Quem sabe eu mesma não saiba porque ainda não fui embora.
Você sempre foi tão praticidade e eu toda romance, como pude ter acreditado que daria certo? Essa paixão agitou tudo e agora que a poeira baixou vejo todos os meus sonhos e anseios amordaçados por esse furacão.
A angústia desse fim percorre todo meu corpo. Será que estou preparada para deixar os destroços para trás?

Paixão

A luz do sol entrava pela pequena janela e refletia nos seus olhos e na água, que caía sobre seu rosto e fazia brilhar sua barba castanha. Naquele momento eu soube que estava rendida pelos seus olhos cor de mel. E agora, como posso aceitar o truque cruel do destino que grita que não fomos feitos pra sermos "nós"? Eu sei que preciso ir embora, só não sei como.
Não é você. Não ainda. Não dá, não flui, não desce. Mas o que faço com a paixão que, teimosa, brotou aqui no peito? Enquanto as diferenças insistem em se revelar em caixa alta, essa pontinha de esperança me toma inteira num sobressalto. Tenho medo de que as noites fiquem longas demais sem seus braços em volta de mim, de que o pescoço fique leve demais sem nosso pingente especial, de que os dias fiquem tristes demais sem o seu alô... Já não sei se posso voltar a ser o que era antes da sua aparição.

O perdão

     Precisei passar mais um ou dois dias remoendo todo esse sentimento que de repente veio a tona dentro de mim para chegar a qualquer conclusão que fosse. Gostaria de dizer que me apaixonar por outro tirou qualquer vestígio de você dos meus pensamentos, mas é mentira. Você sabe, depois daquelas fotos muita coisa que repousava se agitou: nada que já não soubesse antes, assumo, mas muitas verdades das quais eu tentava desesperadamente fugir. E, definitivamente, negá-las não vai fazê-las desaparecer.
Os fatos são: Eu não deixo de pensar em você por um dia sequer, sei que já fazem meses, mas essa história ainda me tortura diariamente. E... eu não te perdoei. Mesmo que fosse possível que você voltasse agora cheio de palavras doces a oferecer, a mágoa me afastaria. E é essa a parte mais dolorosa. Eu não te perdoei e não perdoei a mim mesma, não sei se um dia conseguirei, e é só por isso que essa história ainda me assombra.
Eu ainda te amo mas não te quero, dá pra entender? Mesmo que fosse possível - o que não é - , eu não poderia, nunca mais, ficar ao seu lado. Já cansei de me torturar a procura de uma solução, de uma ajuda, de uma saída. Sei que quando for capaz de te perdoar, também serei capaz de seguir em frente e amar outra pessoa, sei que esse meu sentimento vai embora junto com as frustrações, as mágoas, a raiva, a dor, eu sei! Mas já não sei o que fazer para me ver livre de você.
Tenho passado por tudo isso sozinha, é claro que pra você o tempo passou diferente, mais rápido, talvez. Você tem o seu mundo, e eu não faço mais parte dele há tempos. Você não tem noção da minha luta tão acirrada com um boneco do passado que insiste em permanecer no meu presente, e mesmo assim é humilhante compreender a importância de um alguém que nem sequer sabe que ainda existo. Meu orgulho se contorce ao me ver sofrer tão sozinha com um sentimento tão unilateral. Não que isso fosse fazer diferença, visto que não mudaria os fatos - Não mudaria o passado; Não mudaria nossa história. - Mas talvez eu me rebaixasse menos se soubesse que você também sofria tentando me tirar do peito. Eu não me importaria que você me odiasse, desde que essa história te afetasse de alguma maneira tão intensa quanto a sua presença em mim.
Agora, encarando os fatos, tudo parece ainda mais fora do lugar. Está tão claro e tão desesperador o quanto você ainda me afeta. E tenho medo de que isso dure pra sempre. Essa raiva, essa dor. E medo de que nunca consiga ser feliz com alguém pelo fato de ter sido tão infeliz com você.
Eu preciso te perdoar para perdoar a mim mesma. Eu preciso do perdão para me dar a chance de ser feliz.


Não é a primeira vez que isso acontece, não é a primeira vez que te busco e não te acho mesmo com o universo conspirando a favor. Por que ele está, não tá? Ele grita que fomos feitos um para o outro e que eu preciso te provar isso, não é? Ele me faz lembrar que eu ainda não te esqueci, só pra que eu não esqueça que o nosso amor é um desses impossíveis que precisam doer muito pra dar certo no final, né? E eu choro enquanto a música termina porque eu sei que não. Amor que machuca não é amor, amor unilateral é esquizofrênico, não rola, não desce, não dá. O nosso barco tá furado e não importa quanto tempo eu dedique para colocar a água pra fora, ela sempre vai entrar de novo, até que eu vou cansar que de encher o balde com as suas indiferenças e afundar agarrada em uma história que eu sempre vivi sozinha. Observo o celular com o seu nome brilhando no meio da tela, o número chamado não existe, nem a gente.

Vestígios

Sabe, rapaz, foi muito difícil me livrar de toda a bagunça que 'cê fez em mim. Deu um trabalho danado pra me desintoxicar do veneno, da dor, da raiva... Pra colocar os pedaços em ordem, aquela parte da minha alma que 'cê despedaçou e deixou espalhada por aí. E, sabe como é, apaguei todos aqueles vestígios porque sabia que ia doer lembrar da gente depois de todo esforço pra te tirar de dentro de mim. Demorei muito pra entender que ficar olhando nossas fotos perfeitas não ia consertar o que havia de tão errado na gente, e fiz uma fogueira enorme pra queimar todas aquelas fotos, pois sabia que qualquer fogo era pouco pra transformar em cinzas o tamanho do significado daquelas imagens.
Eu tive que jogar quilos de maquiagem por cima de todas essas cicatrizes que ficaram no peito. E joguei maquiagem no rosto também, pra esconder as olheiras, pra parecer feliz nas baladas que frequentava assiduamente na tentativa de te esquecer. Subi no salto, engoli seco e sufoquei todas as lembranças pra poder seguir em frente; evitei falar, escrever e até pensar sobre nós. Achei que ignorando podia apagar de vez esse passado.
Mas hoje, no meio da vida blindada que construí pra mim (depois de ser estraçalhada pelas suas investidas), eu dei de cara com uma brecha: um pen drive velho esquecido no fundo da gaveta recheado da nossa história. Uma coletânea de fotos, textos e mensagens que achei ter apagado pra sempre. 'Tava tudo muito afiado e feriu fundo, 'cê nem imagina. Meus olhos se derramaram em lágrimas, todas essas lembranças entraram como uma mão gigante e trouxeram de volta a sujeira que enfiei às pressas debaixo do tapete. Tá tudo aqui, rapaz, as lembranças, as mágoas, a dor, tudo exatamente como você deixou.
Daqui a alguns dias vai completar um ano desde aquela tarde pálida de natal em que vo me abandonou. Não pela primeira vez, mas pela última. 365 dias. E ainda dói.
Eu retomei o meu mantra, esperançosa; recomecei a minha missão. Apaguei todos aqueles vestígios mais uma vez, e, mesmo sabendo que vai levar um longo tempo pra apagar da memória, pisquei várias vezes, limpei o choro e me levantei. 'Tá tudo de cabeça pra baixo de novo, pedaços espalhados por aí, mas eu não desisti de mim. Tô juntando tudo de novo e erguendo a cabeça. Eu sei que um dia vai ser preciso muito mais que algumas fotos antigas pra desconstruir minhas certezas. E quando esse dia chegar, rapaz, espero que não 'cê queira voltar, porque não vão existir brechas pra me derrubar.

"(...)Eu nunca entendi por que eu nunca te bastei mesmo tenho me virado do avesso pra encaixar em você.(...)"

Gabriela Freitas


Conto de fadas

Eu cresci ouvindo sobre a "metade da laranja", a "tampa da panela", os casais incríveis que o destino forma; Cresci fantasiando os relacionamentos e ouvindo estórias de amor. E talvez não seja você, ou talvez eu não saiba ainda o que é amar... Mas sempre falta um quê, uma palavra, um gesto, um jeitinho de me arrebatar. Falta alguma coisa que eu não sei explicar, algo que sempre faltou e que me faz questionar se existe mesmo algo acima disso. Quem sabe seja esse o jeito certo, um pouco incompleto, quem sabe esse seja o máximo que se pode gostar de alguém.
Eu sinto sua falta. Me encaixo no seu colo quando tudo dá errado e sei que de alguma forma você é meu porto seguro, mas ainda não me sinto completa. Pode ser que falte um pouco de mim mesma e não de você, mas qual a medida para essa definição? Passei a vida toda esperando por esse "quê" que nunca chega, e hoje já quase quero acreditar que isso é sonhar demais.

Fala por mim

"(...)Ele não tem problema algum, só tem medo.
- Medo?
- Medo de perder o controle, de acabar saindo da zona de conforto em que ele gosta de estar enfiado. Você nunca reparou como ele foge de assuntos sérios? E que quase nunca fala sobre amor e sobre os sentimentos? Ele nunca explode e grita e xinga, só resmunga, reclama, mas não briga. Nunca. Poucas coisas conseguem tirá-lo do eixo. Ele não gosta de lidar com o que não sabe lidar.
- Quem te disse que ele não briga? Quem te disse tudo isso? Saiba que ele briga, sim, inclusive nós dois brigamos muito. O tempo todo. E eu, escuta bem, eu o tiro do eixo. E quem é você?
- Já disse, não importa. E vocês não brigam, cê sabe, quem briga é você. Faz isso sozinha enquanto ele finge te ouvir e pensa na vida. E é verdade, de certa forma você o tira do eixo. E é por isso que eu tô te ligando. Ele não é o melhor homem do mundo, longe disso, ele é marrento e coleciona defeitos, mas tem o sorriso mais lindo do mundo. Ele nunca diz que te ama, mas te olha com o amor de uma vida inteira e a gente sabe que é de verdade. Ele não aprendeu a mentir. Então para de emburrar cada vez que ele liga a televisão pra assistir o time dele jogar, vai lá e se ajeita no colo dele. Para de bancar a possessiva cada vez que ele sai pra beber com os amigos, você sabe que ele jamais faria nada pra te machucar. Ele nunca machucaria ninguém. Nem se quisesse. Ele é perfeccionista demais, lembra? Ele ama quando você manda mensagem, no meio do dia, dizendo que estava pensando nele, porque ele sempre pensa em você, mesmo sem dizer uma palavra sequer. Ele vai abrir o celular, visualizar, apagar e sorrir, é que na cabeça dele você sabe que ele te respondeu. Porque ele respondeu, entende? Todos os dias, desde a primeira vez que te viu, ele responde da maneira como te segura pela cintura na hora em que te beija, te responde quando atende suas ligações no meio da noite pra cobrar mais uma história sem pé nem cabeça que as pessoas te contam, te responde quando te olha dormir e não consegue deter a cara de bobo que brota em seu rosto, te responde quando te leva café na cama, quando coloca a toalha no lugar, tira sua calcinha do chuveiro e te deixa comer dentro do carro. Ele te responde, então não tenha medo de falar, de enviar, de gritar, porque ele responde.(...)"


Gabriela Freitas

Vou ser sincera: Nunca desejei tanto que você realmente sumisse. Durante todo esse tempo eu quem desejei sumir, para que, de repente, você reparasse, sentisse minha falta. Agora, de uma maneira surpreendente, não me importo mais com o que você pensa, desde que eu não precise mais lidar com a sua arrogância. Nunca antes eu me quis tão livre de você.



O fato é que você foi ficando, por acaso, e eu fui negando, por teimosia, que você fazia parte dali. <3

Casal ideal

Sabe o que dizem sobre um "relacionamento convencional"? Esqueça. Você não tem que namorar alguém pra escutar que são um "casal perfeito". Não tem que se preocupar em parecer o par ideal.
Pra sociedade vai ser sempre "Feio demais", "bonito demais", "gordo demais", "magro demais", "novo demais", "velho demais". "Muito falante" ou "demasiado calado". E quando der muito certo vai ser aquela mania dele de beber cerveja. Ou o fato de não beber. Vai ser o jeito que ele te tratou naquela festa, ou o fato de não comparecer. Vai ser o cigarro, ou a lasanha.
Esqueça os padrões. Não há moldes para o amor. Ninguém vai reparar no jeito como ele sorri quando te vê. Não vão saber como aquela mania dela de morder os lábios te dá tesão. Não são eles que vão te acolher naquele dia ruim. 
O ideal é o que te faz feliz.

Medo

Eu estou apavorada. Conheço esse momento em que tudo começa a ficar em segundo plano e ficar ao seu lado parece ser a única coisa realmente importante. Eu sei que estou ficando perdidamente apaixonada quando o passado começa a ficar embaçado e consigo te olhar o tempo todo sem me cansar.
Tenho medo de ver a situação se inverter, de você se afastar enquanto me vejo cada vez mais dependente e carente de você. Medo de que seu encanto passe, medo de que você se canse de mim, medo da paixão; mas ao mesmo tempo nunca, em outra situação, provei sensação tão deliciosa. Estar apaixonada é provar do lado mais intenso da vida. Estava com saudade desse frio na barriga, da ansiedade infantil que esse sentimento dá.
Você me olha de um jeito único e isso mexe comigo. Você fica porque quer ficar, a gente não precisa se pressionar. E eu amo perder a noção da hora e virar a noite com você.
Que Deus me permita nunca perder a capacidade de me apaixonar, mesmo sabendo que o medo vai sempre me acompanhar. Que eu possa conservar a alegria nas pequenas coisas, nos pequenos gestos, nos embrulhos, nos abraços. E que, mesmo apavorada, eu possa sempre estar inteira para poder me entregar.
 

Desabafo: Uma cascata de lembranças

Não tente me enganar: eu sei que às vezes se pergunta se eu ainda penso em você.
A resposta é simples: sim. Quase que diariamente eu penso em algum fato que me remete à sua lembrança. Posso citá-los para você, que tal?
No mês passado acordei as 6 da manhã para ir a uma cavalgada. Me lembrei de como amo cavalos e, em frente ao espelho, me senti bonita; Quando ele me buscou com afeto e boa vontade, eu pensei nas inúmeras vezes em que chorei por ser deixada para trás, e nas inúmeras desculpas que você inventava. Reparei que ele não precisa delas. Ele me pegou no colo e me colocou no cavalo mais bonito. De novo um flash: você sabia o quanto eu amava cavalgar.
Semana passada eu estava tomando banho, e enquanto a água escorria pelos meus cabelos eu lembrei involuntariamente da sua casa, do seu banheiro. Me vi chorando enquanto tomava banho no seu box, sabendo que no mesmo momento você conversava com outra. Me vi saindo e surpreendendo sua malandragem ao apagar as mensagens certas para me enganar. Me repreendi por ter sido tão idiota e prometi nunca mais aceitar tal humilhação.
Ontem mesmo ouvi uma música e me lembrei de você: me lembrei do seu tom irônico ao me acusar por gostar de uma música imoral. Das palavras que você usou. Do modo como me manipulava e me fazia me sentir errada apenas por existir. Olhei para o lado, ele sorriu e cantarolou comigo. Pensei em como deve sempre ser natural ser aceita. Sorri de volta. Cantei alto, sem julgamentos.
Aos que chamarem de recalque: com certeza não viveram um relacionamento abusivo. Não se sujeitaram e se humilharam por alguém para entender que essa lembrança é sim dolorida e não dá pra lembrar com felicidade de uma situação que só trouxe mágoas. Se tivessem vivido, saberiam que repugnar para não repetir é o sentimento latente que nos move pra frente.
E sim, lembrar de você me dá forças para nunca mais repetir aqueles meus erros tão grosseiros.
Outro dia estive num daqueles poucos lugares públicos que estivemos juntos. Lembrei de você. Precisamente, lembrei de você encontrando comigo por acaso e fingindo não me ver. Da sua careta ao dizer pras suas amigas que ia sair dali por minha causa. Me senti mal por lembrar como eu ignorei quando me contaram e de como, mais tarde, você desmentiu e alegou que era implicância. Chorei ao lembrar que acreditei.
Você se pergunta como eu posso lembrar só das coisas ruins, alega ter tantas coisas boas pra lembrar, pois eu respondo: Naquela tarde em que assistíamos filmes tudo parecia lindo, mas eu sabia que você havia mentido pra uma outra qualquer que iria dormir para estar comigo. Naquela noite que dormiu comigo eu senti o cheiro de um outro alguém. A lembrança daquela lua cheia, daquela música, se perdeu no seu bafo de álcool que te fez errar meu nome e você sequer se lembra. Seu telefone sempre tocava enquanto a gente fazia amor. Você estava sempre com um pé atrás, sempre preocupado, sempre planejando, e eu percebia. E na primeira vez que você me culpou por tudo que me fez, você matou qualquer lembrança boa que ainda restasse. Você quis justificar o injustificável, e então tudo se perdeu na sua arrogância.
Eu aceitei o inaceitável, mas foi por falta de amor próprio. E isso não se ganha, não se compra; se aprende. E eu aprendi com você.
E por lembrar tanto de você é que sei valorizar cada atitude digna dele, cada demonstração de afeto real. Sei exigir ser, no mínimo, bem tratada. Hoje eu sei que valho muito mais do que você me fazia acreditar.

"Now you never, never get to clean up the mess you made...
And it hurts me every time I close my eyes (...)
Too young, to dumb to realize...
You should have bought me flowers and held my hand,
Should've give me all your hours when you had the chance.
Take me to every party, cause all I wanted to do was dance.
- Now my baby is dancing, but she's dancing
With another man."

(Boyce Avenue) 

Presente

Eu entro no carro cantarolando, e o vejo sorrir. Ele pergunta se já me disse hoje o quanto sou linda e suspira fundo enquanto me abraça. Durante a viagem, ele gargalha de satisfação sempre que toca uma de minhas músicas prediletas e começo a saltitar, e belisca de leve minha bochecha num gesto de aprovação.
É um pouco estranho pensar que ele não me conheceu na minha época mais sombria, não faz ideia da pessoa infeliz e desgostosa que eu fui. Ele sabe que eu não cuidava de mim, mas sei que é difícil pra ele imaginar. Talvez não tenha noção da gravidade das dificuldades que passei, e isso é ao mesmo tempo incrivelmente lindo e incrivelmente triste.
É lindo porque me sinto satisfeita em poder oferecer o meu melhor. Deixar pra trás um pesadelo terrível e viver a realidade foi uma das minhas principais - e mais difíceis - metas. É lindo ver minha vida sendo passada a limpo, pessoas me admirando pelo agora, vivendo o presente comigo.
Ele sabe que não tenho muito, mas conhece a menina vaidosa e radiante que me tornei. Conhece a imensa coleção de sapatos, e questiona numa careta por quê eu precisaria de mais. Lembra vagamente de me ouvir contar que às vezes não tinha o que calçar, mas só enxerga a imagem bem arrumada que vê todo dia as 18:30 saindo - sorrindo - do trabalho.
A parte triste é que ele não sabe que existem dias em que fecho os olhos e me vejo olhando pro chão, envergonhada, enquanto um outro alguém perguntava com ironia porque eu só calçava as mesmas havaianas surradas. Por mais que eu tente explicar, ele não compreende que eu tento suprir as carências do passado com meu consumismo às vezes exagerado. Ele não tem noção do quanto essa lembrança ainda dói.
Ele não sabe que eu tinha medo das pessoas e, apesar de me ouvir contar superficialmente esse fato, nunca me viu ter uma crise de ansiedade. Obviamente eu dei as instruções caso aconteça alguma, pois não quero cometer o erro de deixá-lo tatear no escuro. Mas ele sabe do meu choro manhoso, entrecortado de soluços, que já aprendeu a curar com um abraço. E isso é tudo de mais terrível que ele realmente conhece em mim.
Ele está comigo, não com os meus fantasmas. E isso é maravilhoso porque, mesmo que ele não conheça o contraste entre a pessoa que eu fui e a que sou agora, eu sei que me limpei de toda a sujeira e me livrei de todo peso do passado para finalmente me entregar inteira para alguém. Eu sei da minha vitória, e ela está estampada no abraço carinhoso que ele me dá todos os dias ao me ver sorrir. Cada vez que ele enxerga em mim o melhor que posso ser, uma lembrança dolorida se vai.

Expectativas

   
 
     Eu sou a garota que nunca teve uma festa surpresa. O instinto de liderança desperdiçado em uma carcaça solitária, a dona das reuniões que não fazem falta. Sou a lágrima de cada aniversário - a espera de um halo, de um amor, de um alô -. Pulsa em minhas veias o romantismo não retribuído, os sonhos não realizados,  a dedicação .
    Eu sou a garota que eternizou a espera. Sou vontade, sou desejo, sou expectativa. O romance que não saiu do papel, a viagem que não saiu do mapa, a procura que não chegou
    Eu não sou covarde! Não, isso eu não sou. Sou dona das histórias, organizadora dos eventos. Portadora das fotos comprometedoras. Mas não protagonista delas. Eu faço por todos o que gostariam que fizessem por mim, na tentativa de preencher um espaço vazio que tanto dói.
     Eu sou garota que ama os amigos e os amores que não teve, que sonha com os que nunca virão.
 

Paixão

Será que é sempre assim quando a gente se apaixona? Será que a gente sempre percebe tarde demais?
Eu digo: 'eu não gosto tanto assim dele' e cito os seus inúmeros defeitos. Mas em seguida penso em como seria sem graça aquela festa sem a companhia dele. Faço uma lista de coisas que gostaria de fazer, e, olha só que absurdo, nenhuma delas parece ter graça sozinha.
Será que sempre que a gente assume que tá refém de alguém todo mundo à nossa volta já sabe disso há meses?
Pouco mais de 24 horas e eu saturei de saudade. Logo eu, que gritei aos quatro cantos que a gente não combinava em nada, que eu ia seguir sem ele... Como uma dependência, você só se dá conta na ausência. Vai ver se apaixonar é isso: um vício. Delicioso.

Encontro

Talvez eu não esteja assim tão diferente. Mas me sinto diferente. E quando te olhei, foi através de outros olhos que te vi: os olhos de uma garota nova, cheia de novas prioridades e mais segura de si. Vi um garoto que fez parte do meu passado, de quando os sentimentos eram outros. Eu te vi sem a neblina da paixão.
Confesso que, por um segundo, pensei se você teria notado, se podia enxergar o quão vazios meus olhos estavam agora pra você, o quanto meus cabelos estão mais fortes, a pele mais bonita, mas no fundo não faz diferença. Eu me sinto assim. E te ver me fez descobrir que quem você é no presente não afeta a pessoa que sou. Você faz parte de antigas mágoas, antigos traumas, dores de uma outra vida. Sua imagem não pode mais me atingir.
Talvez você tenha estranhado a maneira leve como fui embora, ou nem tenha reparado. Não faz diferença. Voltei pro meu mundo e pra nova história que construí pra mim. Fiz o caminho de volta cantarolando e esse vislumbre do passado morreu ali.
Eu virei a esquina sem olhar para trás.

Conto

Ela estava ali. O corpo moreno coberto em partes pela toalha branca. O contraste reluzia no espelho. Ela estava de olhos fechados.
Ele a observava, estático, os olhos cheios de desejo. Com o dorso da mão, afastou delicadamente uma mecha de cabelo do rosto dela. Com um toque leve como pluma, percorreu as mãos pela pele. Pescoço. Ombros. Cintura. Ela suspirou. Glúteos. Coxas. Tocou com cuidado cada curva, admirando a beleza do corpo nu. A luz fraca destacava as covinhas nas costas, ele as tocou, ela sorriu de leve.
E permaneceram imóveis, serenos, numa espécie de transe. Não pensavam nos corpos se fundindo minutos antes. Somente prestavam atenção na respiração um do outro.
Ela se sentia única, se sentia bonita. Sonhara a vida toda em ser olhada assim. Esse momento era pra ela o êxtase, o arrebatamento. Gostava de se exibir, é verdade. Deixara que a toalha cobrisse apenas parcialmente o corpo de propósito. Gostava de ser desejada. Ou melhor, gostava de ser desejada após o sexo. Um desejo puro, livre de interesses. Queria que o amante a admirasse mesmo depois de satisfeito.
Mas o silêncio dentro dela de repente se tornou um barulho alto demais. E esse barulho - uma sirene interna - a fez acordar do transe. Era assim: Para ter o que ela queria, ela precisava ser como nuvem, passageira. Amava de menos pra ter encanto a mais, pra brincar de contos de fadas. Aspirava o máximo que podia, mas ia quando tinha que ir.
Como se tivesse terminado de ler um livro, fechou a capa. Levantou, se vestiu. Ela não era menos intensa agora do que havia sido um dia, apenas sabia quando ir embora. E isso lhe dava uma sensação de superioridade, ela agora tinha uma pitada de arrogância. 
Ele achou que aquela arrogância a deixava linda. 'Lhe atribuía poder', pensou. Com pesar, beijou-lhe os lábios num murmúrio, admirou-a no espelho enquanto ela saía pela porta. 'Saudade', sussurrou. Ela jogou um beijo e desapareceu.

Retorno

Nos primeiros dias eu sonhava exatamente assim: Ele me procurava. Me dava explicações, o motivo por ter ido embora. Depois, tudo virou neblina. Ele não passava de uma névoa embaçada no meio de tantos sonhos aleatórios. Então, aos poucos, deixei de sonhar com ele, deixei de me preocupar, enfim, com o que teria acontecido. E enquanto ele estava longe, eu estava protegida de todas as coisas não ditas que cercavam nosso fim repentino; coisas que sufoquei com cuidado em algum lugar obscuro do peito.
Mas então aconteceu: Ele chegou com calma, como se certificasse de que era seguro. Tentou estabelecer um contato menos áspero. Uma tentativa, duas, na terceira se aventurou a tocar em assuntos latentes entre nós. Eu estava distante, fechada, e minha resposta soou rápida e automática: "Tudo bem". Fim de papo. Ele percebeu, recuou. E as imagens voltaram na memória, como um flash. Por que diabos ele quer explicar coisas há tanto tempo enterradas? Uma raiva subiu pelo meu peito, queimando, queimando. Queria gritar o quanto doeu quando ele se foi sem me dar explicações. Queria acusar, cuspir, ameaçar. Dizer que foi difícil e que ele não tinha o direito de reaparecer assim. Mas sufoquei um grito mudo na garganta, fui pra casa e adormeci.
Voltei a sonhar com aquele momento em que ele voltava, e eu descobria que tudo não havia passado de um engano. Mas a realidade sempre é diferente, e agora eu tenho uma outra vida. Novas pessoas, novas mágoas.
E ele voltou. E de novo, e de novo. E num dia disse com uma normalidade absurda que haviam muitas coisas a serem esclarecidas. Sim, é claro. Mas a questão é: já não sei se quero esclarecê-las. Estava infinitamente melhor quando deixei tudo isso pra trás.
Mas não dá pra fugir do que está tão perto, não adianta tapar os olhos. Terei que enfrentar esse passado, encarar essas ruínas. Não há outra maneira.

Procura

O mais estranho é que enquanto eu me esforçava para me envolver, e pulava de uma tentativa a outra, fracasso após fracasso, eu não me dei conta de que já estava completamente envolvida com você. Você esteve tão perto e eu não enxerguei que era sempre o seu número que eu discava pra contar dos meus problemas e meus medos mais banais.
Eu busquei o tempo todo por outras vozes, mas sempre foi a sua que me trouxe conforto até nos dias mais terríveis.
Quero fugir, mas é você que conhece minhas manias e ri das minhas palhaçadas, que me olha como se eu fosse a mais linda de todas as mulheres. Você que se encanta pelas minhas manhas, e se hipnotiza pelo meu sorriso. Sinto cheiro de problema, mas é você quem me diz o quanto eu sou inteligente e fica atento por horas me ouvindo falar. Como ir embora se é aqui que me sinto em casa? Pra onde ir se o seu olhar parece ter sido sempre o meu lugar? Eu não posso me deixar levar, mas é você que limpa minhas lágrimas quando tudo parece desabar.
Eu me encantei por outros sorrisos, me iludi por outros olhares, mas é só você que me traz paz. É sua companhia que quero em qualquer situação; Naquela festa maluca ou naquela noite quente ou no domingo chuvoso...
E então, eu apenas parei de procurar. O amor está nas pequenas coisas, o arrebatamento vem na naturalidade, é loucura achar que posso guiar meus sentimentos. Estou fadada a me apaixonar pela pessoa errada.

Ele tem o cabelo tão negro e macio que parece irreal. Aquele sorriso é perfeito por natureza, dono de uma hipnose insana. O contorno do rosto, os olhos, alguma coisa nele me chama atenção. Mas tem aquela estranha sensação de que algo está errado, e ainda assim insisto em permanecer aqui.
Eu não estou exatamente apaixonada, mas gostaria de estar. Parece uma oportunidade e tanto de seguir em frente, de viver uma coisa diferente que não as antigas mágoas já tão repetidas. Mas não me sinto inteira; Uma parte de mim grita "vai garota, anda, se joga", e outra parte quer que eu permaneça indiferente, dormente, isenta de qualquer sensação mais intensa.
Ele pediu, tímido, "namora comigo?", e essa frase, de repente, já não fazia sentido algum. Há tanto tempo eu já não sei como é estar de verdade com alguém, não sei se ainda sou capaz. Prometi pensar, e tenho pensado -juro-. Mas não consigo ter uma resposta.
Já cansada de trazer o passado em cada gesto, penso em como seria bom ter uma nova história. Ter um presente pra viver. Mas em seguida vem o medo, paralisante.
Talvez eu mereça uma chance (Talvez nós mereçamos). Quem sabe todos mereçam sempre novas chances e novas tentativas, afinal, o tempo passa e a vida só para quando a morte chega. Nesse intervalo as chances vem e vão, basta agarrá-las. Tudo sempre pode mudar - talvez não para melhor, mas sempre diferente -, e não se pode desistir de agarrar a chance certa.
Ele me encanta, é verdade. Acho que posso pensar melhor sobre apostar algumas fichas nesse encanto.

Insensível

Não sei se é culpa das mágoas ou se é mesmo da rotina diária de um coquetel de remédios, mas dentro de mim tudo está dormente. Sem frio na barriga, sem dor. Parece que uma casca dura se formou e as únicas coisas que conseguem me atingir são as que já estão do lado de dentro. As velhas mágoas, as paranoias de sempre. O que acontece no presente não me afeta, e isso me assusta. Que tipo de monstro eu me tornei? Finjo me preocupar, mas tenho noites tranquilas de sono. Vazio. O mundo está caindo ao meu redor e eu simplesmente não consigo sofrer com isso. Acho que já não estou mais tão normal. Me tornei brutalmente egoísta e sei que tem algo muito errado dentro de mim. 

Banquete


É que a gente tá acostumado a ser tão mendigo, tão maltrapilho, que quando chega alguém que dá mais que migalhas você primeiro desconfia, dá um passo pra trás. É difícil se convencer que se pode ser tão mimada assim. Dá um pouco de enjoô no estômago, tipo quando se passa dias comendo apenas miojo e pipoca e de repente bate uma lasanha bem temperada. Dá até tontura. Mas satisfaz. O organismo leva um tempo pra aceitar comida boa de novo. E aos pouquinhos você vai se nutrindo e o corpo fica de pé. Saudável.
Ele é lasanha e o cardápio todo, e não dá pra solver tudo num dia só. Não sei se fico feliz ou desesperada, mas dá um puta ego ser tratada como uma princesa e eu tô tentando me habituar. Já tinha até me esquecido de que mereço ser bem cuidada e viver essa paz. 

Amigos

Eu me rendo aos antigos clichês. Sim, amigos são anjos. Passei tanto tempo sozinha que havia esquecido o valor de uma boa companhia. Passei tanto tempo perdida e agora é tão bom saber que me encontrei.
A casa cheia, o barulho, as vozes, a música. O ambiente trazia uma euforia intensa, a vida reluzia naquele copo colorido e dentro de mim só existia alegria... O antigo vazio de sempre não estava mais lá. Eu não estava fugindo de mim, eu não precisava. As luzes brilhavam na parede e as pessoas sorriam verdadeiramente. Eu sabia que não estava sozinha, não mais. Com a vista um pouco embaralhada pelo álcool eu via olhares transparentes e livres de julgamentos. Eu estava segura.

Espelho

    Eu vi nos seus olhos o reflexo da pessoa que eu era -Que já fui, ou que ainda sou, não sei- ,mas vi eles implorarem por atenção num pedido mudo de socorro, saltando das órbitas brilhantes de lágrimas e pousando, angustiados, sobre o meu olhar. Vi em você os gestos desesperados movidos pela necessidade absurda de ficar ao meu lado. Uma estranha queimação me invadiu o peito ao te ver ali, num impasse, e ler na sua expressão a razão te mandando ir embora e sua carência te paralisando.
   Eu tentei, juro que tentei não deixar transparecer o quanto aquilo me incomodava, mas você percebia quando meu olhar vagava longe, e isso te feria tanto, que me feria também. A reciprocidade não tornaria esse sentimento saudável, mas traria menos angústia para ambas as partes. Mas eu não conseguia querer você na mesma intensidade. Só conseguia lembrar incessantemente de cada uma das milhares de vezes que supliquei por ficar ao lado dele, que fiquei paralisada pelo medo de me afastar, que sofri pela insistência que meu sentimento causava. E quanto mais me via em você, mais me sentia culpada e as lembranças doíam em mim. Preferia não saber como essa sensação é cruel, preferia não me importar e te deixar ir. Mas acatei o seu pedido e adormeci ali, no sofá, enquanto você apenas me olhava, hipnotizado.
     Sei que você me queria, mas não podia te dar um beijo que não te pertencia. Não podia te oferecer desejo, e prometi não oferecer nada pelas metades, e não o fiz. Sei o quanto quis me tocar, mas permaneceu ali, imóvel, regularizando a respiração.
Você disse compreender, mas sei que não aceita. Será que você entende que nunca quis ver ninguém se sentir assim por mim? Durmo e acordo com essa culpa, como se estivesse sendo responsável agora por tudo que passei no passado. Não quero mais ver você porque não quero ter que encarar as feridas antigas. Quero poder esquecer, seguir em frente, e você traz as lembranças tão vivas...
     Espero que você me perdoe, assim como espero que eu possa me perdoar também.


Aquele olhar, aquela presença, eu não conseguia assimilar. Era como se eu tivesse tido a chance de te ter de novo sem o peso do nosso passado. Somente quando amanheceu é que me dei conta de que não tinha sido real. Ele tinha sua expressão, mas não era você. Ele me olhava daquele jeito e quase tinha o seu cheiro... No escuro, o contorno da boca me confundia, eu me perdia, me prendia, e os olhos me hipnotizavam e me levavam pra um tempo confuso entre o passado e o presente. Mas não era você. Ele nada tinha a ver com o passado turbulento que vivemos, mas aquela imagem estava carregada de lembranças e eu não podia lidar com isso. Quando amanheceu, eu o deixei ir, junto com esses fantasmas.

Seguindo

Eu me afastei de pessoas que faziam parte do meu cotidiano e, mesmo sendo julgada por isso, tentei ser o mais egoísta possível por questão de sobrevivência. Eu segui em frente e tudo ficou tão em paz que acreditei que estava pronta pra tudo, inclusive retomar uma vida que há muito tinha deixado pra trás, e carregar nas costas um peso que já não me pertence mais.
Por um segundo eu quase voltei. Quase enlacei meus pensamentos nas âncoras do passado. Quase dei um nó. Estive com um pé na ponta do abismo e, meu Deus, eu quase pulei. Talvez não tenha diretamente a ver com ele, ou talvez ele seja uma ponte, não sei. De qualquer forma chegar tão perto do passado me fez entender o quão acertadas foram minhas escolhas de agora.
Todas aquelas pessoas e todos aqueles lugares fazem parte de um pesadelo que não quero reviver.
O que sinto por ele... Bem, isso não é mais algo que me atrapalhe. Meu sentimento é tão mais bonito agora. Mais puro, mais leve. Eu guardei tudo numa caixinha no fundo do peito, e lembrar dele todos os dias já é uma rotina com a qual aprendi a lidar.
Eu posso amá-lo na minha vida nova e isso me deixa muito mais em paz.
Eu voltei pra minha zona de conforto. Eu tenho meus amigos e minhas histórias. Tenho as pessoas novas que mexem comigo de uma maneira menos intensa. Tenho ele na cabeça também, o tempo todo, mas não quero lutar contra isso. Apenas continuar sem olhar pra trás.

"Há quem diga que quem anda só é melhor do que ao lado de quem não me quer bem. (...) Vou tomar o caminho mais reto, vou seguir direto até onde eu quiser. Vou levar esse amor solitário tranquilo e na boa até onde eu puder. Veja só, eu podia estar ao seu lado... Mas não deu."

Quando o amor vier...

Foi um choque perceber que, de repente, eu estava cheia demais de mim pra que alguém pudesse entrar sem bater. Confesso que esperava o de sempre: verter qualquer romance em oxigênio, e mergulhar fundo em qualquer sentimento raso. Esperava a tentativa desesperada de fugir de mim na primeira oportunidade viável. Tive, sim, meus devaneios e transformei encanto em poesia, mas encanto é só uma nuvem bonita que passa no céu: daqui a pouco já mudou de forma, de repente sumiu e só o céu azul. Romances superficiais não podem mais me tomar o que construí de tão concreto em mim. 
Surpreendentemente veio a leveza, a calma, o sorriso; e eu me assustei quando dessa vez eu escolhi partir. Sem peso, sem culpa, sem medo.
Por muitas vezes minha angústia me obrigou a ficar mas agora eu sou dona de mim, e é tão bom poder fazer as próprias escolhas, finalmente.
Você pediu: "Fica.", mas eu havia prometido que nunca mais ficaria pela metade, e não ficarei, tente entender. 
Eu não deixei de sonhar. Sim, um dia eu vou ficar, é claro que vou. Em algum lugar, com alguém que me faça sorrir. Eu vou pular quando o sentimento me der asas. Quando o amor bater em minha porta, sim, eu vou abrir. Mas se for só brisa, aceite, eu apenas vou fechar a janela.  
Poucos vão ler o texto até o final, mas sabe aquele momento em que você precisa desabafar? Então entenda: eu não quero confidenciar isso pra um amigo. Eu quero gritar pro mundo. Esgoelar. Espalhar por aí que esse aniversário é um dos mais importantes da minha vida porque eu nunca estive tão feliz. Eu, que sempre reclamei de tudo, hoje quero agradecer. Agradecer às pessoas que chegaram comigo até aqui. Meus amigos, minha família. Pessoas que me aceitaram do jeitinho que eu sou, que me fizeram sorrir de verdade, aquele riso frouxo de quem está em paz e em boa companhia.
Hoje eu quero gritar que eu tô bem. Tô bem de verdade, e pra quem duvidou que eu me reergueria, olha pra mim, estou de pé, mais firme do que nunca.
Aos 23 três anos de idade eu redescobri a vida. Eu conheci a vitória. E só tenho a desejar que a vida me permita tantos outros aniversários incríveis assim.
Parabéns pra mim 

Sabe como é, se fosse alguns anos atrás, quem sabe eu me apaixonaria por você. Talvez eu saísse correndo de casa na esperança de te ver, e achasse fofo seu jeito forçadamente romântico de me tratar... Ou talvez pensasse mesmo que você gosta de mim, e levasse a sério quando você me chama de "namorada". Mas, sabe, garoto, eu não sou mais a mocinha ingênua que já fui. Economize suas rimas e seus olhos azuis, sua falsidade me dá fadiga, meu estômago é fraco pra tanta levianidade.
Eu não saio mais da minha zona de conforto, não me deixo levar por tão pouco. Eu vi o suficiente da mentira pra optar pela verdade, não escolho mais me preencher com ilusões.
Quero o que for natural, o que o tempo trouxer com leveza e o que eu puder sentir no ar. Entenda, menino, o que é de verdade se infiltra na atmosfera e hoje eu sei disso.
Não precisa beijar minha mão nem me dizer que sou a mais linda da festa. Não precisa enviar um texto se desculpando pelo sumiço de ontem. Eu não estou interessada em quem você é, no que você faz. Eu não ligo pra sua vida ou pras suas redes sociais. Economize suas mentiras e seus galanteios, sabe como é, não que eu esteja desvalorizando você, mas, por favor, eu tenho mais o que fazer.

Olha que maluco: eu me sinto a mocinha daqueles filmes adolescentes melosos que costumavam passar na sessão da tarde. E não é pela condição financeira - longe disso, as coisas nunca estiveram tão difíceis financeiramente - nem pelas tramas de amor complicadas que dão sempre certo no final. É pelo conforto. Repito: não pelo conforto material, mas pelo espiritual. Pela consciência limpa, pela rotina simples e deliciosa.
Eu me sinto um misto de adolescente despreocupada e ao mesmo tempo tão mulher.
Eu trabalho o dia todo e volto pra casa com um sorriso no rosto, me jogo no sofá e recebo os lambeijos carinhosos da minha companheira fiel. Visto meu pijama rosa bebê e tomo um chocolate quente enquanto conto vagarosamente os detalhes do meu dia pra quem me quer bem.
Alguma coisa agora floresce diariamente aqui dentro; foi-se o tempo em que o inverno durava o ano todo. Não existem mais mentiras e, acredite, não preciso mais fugir de mim. Nada de álcool pra sorrir forçado, nada de um copo pra ficar afim. 
Eu choro por pouco, faço bico quando dói, eu tento te fazer sorrir, eu canto alto, danço mal. Eu fico horas no telefone, eu sorrio pra uma mensagem atoa, eu peço colo, eu peço abraço. Eu sou pura e simplesmente feliz. Essa adolescência tardia mudou a cor da minha pele, o brilho dos meus olhos, até meu cabelo melhorou.
Então faz assim, engole qualquer amargura, porque quero essa negatividade longe de mim! Eu já tive meus próprios pesadelos e quero o direito de sonhar. A partir de hoje eu só quero o que for somar. Eu me dei o direito de permanecer longe daquilo que me faz mal e entenda como quiser: se quiser chamar de egoísmo, eu não vou brigar, gritar, me chatear. O tempo me ensinou que isso se chama auto estima, e é por isso que eu vou lutar.

Cinderela Compulsiva

Tenho ouvido com frequência questionamentos a respeito da mudança do nome do meu blog. Alguns dizem, inconformados, que o antigo nome já era característico, outros alegam preferência absoluta ao segundo título, mas todos tentam entender o motivo dessa troca repentina. A vocês, que estão buscando um motivo complexo para essa troca, eu lhes afirmo: a resposta é bem simples. O termo "Cinderela Compulsiva" não combina mais com o que vivo diariamente.
Por anos a fio eu vivi obcecada por romances, pulando de uma história vazia à outra na tentativa frustrada de me preencher. Por todo esse tempo minha compulsão inconsciente em ser uma "Cinderela" e essa necessidade de ser - ou ter - um par ideal, me fez ficar vazia de mim.
Há alguns meses atrás eu me deparei, assustada, com uma imagem nítida no espelho. Eu estava completa. Eu não precisava mais me verter em romances para fugir de mim. Eu descobri que os danos me amadureceram para uma nova etapa: a de gostar de quem eu sou. A de me bastar. E, ao contrário do que ocasionalmente pode parecer, não estou me vangloriando de estar solteira. Estou comemorando o fato de poder estar inteira em qualquer situação. Deixar de ser uma "Cinderela Compulsiva" não significa ficar sozinha; significa aceitar as várias etapas da vida com tranquilidade; Eu posso estar solteira sem me desesperar, ou posso permanecer com calma e maturidade em um relacionamento. Nada por necessidade doentia; mas sim por prazer. Por escolha. E isso é lindo: a escolha.
Hoje eu estou em paz e às vezes tenho a sensação de que nunca vou me cansar de repetir. E essa paz não combina com um nome tão doentio e turbulento como o de antes.
Eu estou aqui, no meu mundinho platônico, decifrando sentimentos, desabafando o que fica grande demais para caber no peito. Estou aqui mostrando o mundo pelo meu globo ocular. E me despedir daquela antiga personagem era o passo que faltava nesse novo cenário da minha vida.

É com muito pesar que hoje eu venho pra falar da morte. Não pra quem vai, pois daqui do lado de cá eu jamais poderia saber sobre. Mas pra quem fica.
A morte dói para aqueles que permanecem vivos. Dói para os familiares, os amigos, os entes queridos.
A morte é a saudade, é a ausência física que nos pega de surpresa e nos faz acordar ainda nos primeiros dias com a estranha sensação de que vamos ver aquele olhar na nossa frente.
Todos nós vamos morrer. Mas o pior é que, antes que chegue esse dia, todos nós vamos perder alguém. E nunca estamos preparados para isso.
Hoje ao amanhecer eu me deparei com a triste notícia de que mais um homem bom se foi. Um homem que pela vida toda me acolheu, me recebeu com um sorriso no rosto, me abriu as portas da sua casa pros meus melhores e pros meus piores dias. Um grande amigo. E, enquanto enxugava minhas lágrimas, eu pensei sobre essa nossa grande e cruel companheira que, queiramos ou não, nos acompanha por toda nossa caminhada.
E é por isso que estou aqui para deixar a minha homenagem a esse grande homem, grande marido, grande pai e grande avô, que deixa hoje as 5 mulheres da sua vida entregues aos cuidados do mundo. Por isso estou aqui para desejar a estas o meu carinho, o meu cuidado, e a força necessária para lidar com a morte.
Que o tempo possa deixar a todos nós a lição de que o elo que nos liga a alguém é um fino fio de cabelo, e tudo que vamos levar são as lembranças, por isso devemos aproveitar da melhor maneira possível cada minuto ao lado de quem amamos. A lição de que a vida é muito frágil, e por isso devemos procurar todos os dias sermos fortes.